A Pauta

Não deem palco para quem samba em cima de tragédia

Por Isabele Campos.

Essa semana eu escrevia uma notícia sobre um acidente, onde um motorista não resistiu e faleceu. Antes de tornar pública a matéria eu li inúmeras vezes e me vi perguntando a uma pessoa que estava ao meu lado: “não tá insensível demais?”. Ela me respondeu com outra pergunta: “Por que estaria?”. Eu lhe confidenciei que sempre penso na família e nos amigos lendo a notícia, sempre me vem o pensamento: “e se fosse alguém que eu conheço?”.

As matérias que envolvem a morte de alguém chegam para nós a todo momento. E as informações geralmente vem em forma de um boletim/nota técnica, com palavras frias. Às vezes eu tenho a impressão que escrevemos tanto sobre o assunto que acabamos normalizando a situação, e em um descuido, podemos acabar lidando de maneira fria com a morte de alguém que era querido e amado por outra pessoa. Sempre caminho em cima de ovos quando os assuntos em pauta são delicados. É preciso um equilíbrio, não sendo muito emotivo a ponto de se envolver demais com a história e nem muito frio, sem delicadeza para tratar do assunto.

Lembro da faculdade, quando fiquei chocada ao escutar um professor dizendo que teríamos que aprender a lidar com cenas delicadas, independente da área que escolhêssemos atuar. Afinal, a notícia acontece sem hora e nem lugar definido, e o repórter que está mais perto…e de verdade, se tem algo que aprendi nos poucos anos de profissão, foi que a gente atrai a pauta, a notícia acontece na sua frente quando menos espera. Então, voltamos a sala de aula da faculdade. Desde aquele dia eu decidi que precisava ser mais forte a imagens complicadas, como as de um acidente. Hoje eu entendo aquele professor. A gente abre o WhatsApp e está lá, aquela foto que todo mundo recebe borrada, nós recebemos bem nítida, e haja estomago.

Se pudesse, eu escolheria somente pautas felizes e boas, mas o mundo não é um conto de fadas. Então a gente vai aprendendo no dia-a-dia a não absorver demais as histórias que contamos, mas também, ter empatia pelo acontecido, sabendo que os personagens da matéria são pessoas reais. Jamais esqueci do dia que vi um âncora noticiando com aparência feliz uma notícia triste. Aquilo me marcou de uma tal maneira. Não quero ser eu a jornalista insensível que magoou pessoas em um momento difícil por conta de uma informação. Toda atenção e cuidado é pouca nessas horas.

Hoje eu só queria dizer que nós nos sensibilizamos com as notícias, só não absorvemos as dores de todas elas. Temos respeito pelas famílias e preferiríamos termos uma pauta mais feliz. Quem me dera poder noticiar só coisas boas. Tomem cuidado nas estradas, rezem pelos seus, ajudem aqueles que estão em um mal caminho! E por fim, em mês de setembro amarelo, preciso dizer que suicídio é uma pauta necessária, mas notícias de suicídios não. Cuidado com o tipo de conteúdo que consome, lembre-se, só é pauta o que é de interesse do público. Não alimentem mídias sensacionalistas. Não deem palco para quem samba em cima de tragédia.

Por hoje é só! Se cuidem!

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